8 de março de 2015

Breves notas quase-literárias (III): sobre "O Cajueiro Nordestino", de Mauro Mota


Em A Oferta e o Altar, de Renato Pacheco, Duca Eleotério, o “decano dos areenses”, faz uma apologia ao cajueiro: - “Do cajueiro tudo é útil ao homem”, diz; e segue daí desfiando as utilidades da árvore, do caju e da castanha – esta, sim, o fruto do cajueiro.

Visitando no Recife a Casa da Cultura, na antiga prisão onde foi executado Frei Caneca, adquiri, na excelente livraria de assuntos pernambucanos que lá funciona, O Cajueiro Nordestino, de Mauro Mota (1982). Monografia com que o autor se candidatou, em 1954, ao concurso de Geografia do Brasil no Instituto de Educação de Pernambuco, trata-se de um panorama sobre a planta em seus aspectos botânico e geográficos, mas também – o que valoriza sobremaneira a obra – históricos, folclóricos e literários. Creio que todos que apreciamos uma cajuada nos regalamos da leitura.

Em Memória Repartida, a certa altura o narrador encontra Eustáquio, o forasteiro que protagoniza os acontecimentos, e mais a namorada, pescando na beira do rio. E para surpresa dele, narrador, a namorada capitaneia o ritual do caju amigo - devidamente descrito por Luiz Guilherme Santos Neves e Renato Pacheco no Índice do Folclore Capixaba, e que consiste no mastigar fatias de caju, extraindo-lhe o sumo, enquanto se bebe por cima uma dose de pinga.  

Cajueiro é planta nativa do Brasil. Mota relembra passagens históricas, como as “guerras do caju” que no nordeste as tribos do interior faziam às do litoral, na época da frutificação, para proverem-se do fruto e seu pedúnculo. A castanha era iguaria apreciadíssima na época colonial, o que continua a ser até hoje.

Conversando com velhos moradores recordei-me que na Praia da Costa de antes da urbanização havia grande incidência da árvore no areal que se estendia desde a praia. Como acontecia, da recordação de Mota, na região de Boa Viagem, no Recife. Lá com a revogação, no tempo, do decreto de Maurício de Nassau que proibia a derrubada, a marcha da urbanização acabou por destruir os verdadeiros bosques de cajueiros encontradiços em várias regiões da capital pernambucana. Por aqui, sem um Maurício de Nassau para coibir, a dizimação das plantas nativas se fez em um curto espaço de tempo.

Mas o caju é popular mesmo em Aracaju, cidade cujo nome homenageia a planta que lhe cobria o território. Além dos inevitáveis chaveiros e imãs de geladeira na forma do pedúnculo do cajueiro, estando na cidade atente também para os doces cristalizados e o excelente licor de caju que podem ser comprados no mercado central da capital sergipana.