9 de dezembro de 2013

Sabalogos gastronômico: de volta

Henrique Herkenhoff, Pedro Nunes, Fernando Achiamé,
 o autor, Ivan Borgo, Caco Appel, Carlos Campos Jr.

Era um dia sete de dezembro. Dia, aliás, como outro qualquer, não precedesse ele, no calendário, o dia oito de dezembro, Dia de Nossa Senhora da Conceição, que batizou tantas meninas Brasil afora ao longo dos tempos e é evocação da padroeira (entre outros dignos de menção) do Botafogo de Futebol e Regatas.  E não fosse, esse dia sete de dezembro, um sábado – portanto, dia de Sabalogos. Que, como em todos os outros sábados, já lá se vão mais de vinte anos, realizam-se no recanto Renato Pacheco da Livraria Logos da Praia do Suá.

Nessa véspera da Imaculada Conceição do ano de 2013, porém, dois acontecimentos tornaram esse encontro dos sabalógicos diferente dos demais: primeiro, a presença de um grupo literário que atende pelo nome de “Confraria dos Bardos”, rapazes e moças cheios das melhores intenções; porque, como rapazes e moças saudáveis, poderiam estar a se ocupar de festas regadas a sertanejos e energéticos, mas não, ocupam-se, também, de Literatura. O que autoriza pensar que a derrocada final pode não estar assim tão próxima quanto supomos assistindo ao noticiário televisivo.

Recebido o grupo literário, desfrutada sua companhia, com direito a registro digital devidamente encaminhado ao facebook, impunha-se, então, partir para o segundo acontecimento da sessão sabalógica diferenciada daquele dia sete de dezembro: o almoço agendado entre os confrades.

Ora, não é, um almoço, simples reunião de congraçamento entre amigos que se estimam e se vêm regulamente - e, o melhor de tudo, para tratar de amenidades, de assuntos agradáveis? Não, impõe-se a resposta. Não se tratava de simplesmente acordar um churrasco entre amigos, que de carnes se compôs o cardápio daquele dia. E a explicação: é que esse saudável hábito sabalógico, de uma regularidade a toda prova em tempos pretéritos, foi sendo abandonado há tempos, aproximadamente dez anos, como que num período de luto guardado pelo grupo em honra dos que se foram das reuniões, todos eles muito mais capacitados, em todos os sentidos – garfos, inclusive – que os remanescentes. Atordoados remanescentes, diga-se, que sem os valorosos extintos a lhes capitanear as excursões gastronômicas que se faziam uma vez por mês a pontos escolhidos da capital, deixaram-se abater e assim dispersar aquela que talvez fosse a marca maior dos encontros, uma extensão autorizada destes (descontado aí, Pedro Nunes, o registro material mais perene da tertúlia, o Mulheres: diversa caligrafia).

Mas tudo correu bem naquele dia, e para alegria do núcleo inicial de organizadores registrou-se a adesão de outros confrades que foram se chegando de última hora, ainda ao local da tertúlia, até que a representação gastronômica acabou fechando em sete, como marcava o calendário. Número mágico, cabalístico, evoca mistérios ao menos desde os tempos dos Sete Contra Tebas, mas a que – Ésquilo bem o registrou – havia cidadela que resistisse.

Não o estabelecimento que nos acolheu; esse não pôde resistir ao talento dos sete circunstantes (que a essa condição se passaram então os confrades tertulianos), sempre alertas, porque constantemente desafiados pelos espetos que traziam direto do fogo a carne consumida de montão. Foram muitos os acontecimentos dignos de nota naquelas pouco mais de três horas; o maior de todos, sem dúvida, a prova do vinho, ritual arraigado, a cargo do expert, que o temos: Ivan Borgo, que comemorava ali a distribuição (que só isso sua modéstia permitiu) de seu recém-tirado do prelo Chão de Araguaia.

As palestras entre os circunstantes, a presença de um coral campo-grandense (dos campos do Mato Grosso do Sul), ciceroneado em terras capixabas pela poetisa Valsema Rodrigues da Costa e que nos brindou a todos com um número musical, tudo isso a se conferir na ata a cargo de Pedro J. Nunes, idealizador do encontro e secretário dos trabalhos desde a expedição dos convites. Sua pena afiada e certeira haverá de perenizar o quanto se passou naquela tarde, que registro perene merece esse retorno ao hábito irrepreensível da tertúlia sabadal.

Eu creio que alguns dos ausentes podem nos ter invejado saudavelmente naquelas horas. Ao menos tenho para mim que alguns deles invejariam, se por aqui estivessem, porque daqueles encontros passados me lembro muito bem de como prezavam o vinho, o convívio, a comida, ainda que não seja essa a ordem apropriada de enumerar as coisas, e ainda que não interesse muito qual seja.

Continuemos, é o que se pode dizer a todos. Que os que não compareceram dessa vez possam comparecer da próxima, que é o que esperamos - que muitas próximas ocasiões se apesentem. Até porque, eu penso, é o retorno a essas excursões gastronômicas, ao hábito que abandonamos não se sabe bem como, que vai realçar e valorizar o silêncio dos garfos e facas e copos por todo esse tempo que não nos animamos a celebrar à mesa a memória daqueles dias.

No mais, aguardemos a ata.