31 de janeiro de 2011

JURISTAS LITERATOS ACADÊMICOS DO ESPÍRITO SANTO


É fato que nas Academias de Letras reúnem-se pessoas que efetivamente demonstraram seu amor ao conhecimento e à cultura. E que este amor deve ser demonstrado, sobretudo, pela ação - ação esta que via de regra se deve traduzir em produção literária. Obviamente que não basta isto, ou as Academias de Letras não dariam conta de abrigar sob seus tetos todos quantos se propõem a “fazer literatura”. Mas de alguma maneira o desejo de fazer parte de algo que para sempre vai existir (porque o conhecimento e a cultura - no mínimo no sentido antropológico dos termos - é inerente ao desenvolvimento humano), o respeito por esta tradição e pelos que a mantiveram viva até aqui são alguns outros requisitos que reúnem na Academia Espírito-santense de Letras quatro dezenas de apreciadores e produtores de letras.

I – Letrados e literatos:

Estes termos – literatura, letras – têm mais de um significado específico dentro dessa idéia de cultura produzida, de cultura como produto do labor intelectual de alguém. Letras tem também o sentido de saber, de conhecimento que se adquire através do estudo. Literatura tem o significado corrente de um conjunto de obras ficcionais de reconhecido valor estético, mas também o de conjunto de obras científicas, filosóficas etc, sobre determinado assunto, matéria ou questão. Assim, um homem letrado pode produzir literatura ficcional esteticamente relevante e um outro pode enriquecer a literatura sobre determinado tema, ou determinada área do conhecimento. Ambos serão homens de letras.

Na pejorativamente chamada “República dos Bacharéis” as letras humanísticas vinham, sobretudo, do estudo do Direito, e assim os bacharéis em Direito (que em sua maioria ocupavam os cargos burocráticos na Administração Pública) eram os legítimos descendentes dos “letrados” dos séculos anteriores. Letrados, no Reino de Portugal e suas colônias, eram inicialmente os versados nas letras jurídicas, que se adquiriam nos estudos de Coimbra. Aliás, foi a partir daí que esta expressão passou a ter o sentido de pessoa que detém erudição, reflexo daquela formação humanística dispensada aos bacharéis conimbricenses.

Desse rápido escorço semântico não é demais concluir que de alguma forma o estudo das disciplinas jurídicas e a reputação adquirida pelos estudiosos dessas disciplinas acabou também derivando no significado de letrado a todo aquele detentor de erudição, isto é, o homem de letras. E que por isto mesmo esses adjetivos os devem hoje os beletristas, em alguma medida, aos juristas.

Para serem admitidos na Academia, estes últimos podem ou não cultivar a ficção, tanto que o Estatuto da Academia Brasileira de Letras admite a candidatura aos seus quadros dos “brasileiros que tenham, em qualquer dos gêneros de literatura, publicado obras de reconhecido mérito ou, fora desses gêneros, livro de valor literário” (art. 2.°). Se se toma “literatura” na acepção corrente, que parece ser a intenção do dispositivo, falamos dos que cultivam os gêneros literários das belas-letras, os romancistas, os contistas, os cronistas, os poetas. Mas fora destes gêneros, livro de valor literário está-se referindo àquele que acrescenta algo ao estado da arte de alguma disciplina, matéria ou questão, na segunda acepção do termo “literatura” acima. Se uns e outros podem ser admitidos na Academia Brasileira de Letras, uns e outros, sem distinção, são homens de letras. Letrados. Literatos. O Estatuto da Academia Brasileira devolve aos últimos, seus originais detentores, o adjetivo que parece terem perdido ao longo dos séculos.

Por ocasião da fundação da Academia Brasileira de Letras, em 1897, o bacharelato em Direito era uma das opções de formação humanística das elites contemporâneas, ao lado da medicina, das letras e também da politécnica (1). Profissionais liberais e servidores públicos, em sua maioria, vinham dos ensinos superiores instituídos durante o Império (que como se sabe, cuidou mais dos segmentos secundário e superior que do ensino fundamental propriamente dito). Assim, entre os fundadores da Academia nacional, vários deles eram bacharéis em Direito, e em sua maioria atuantes na imprensa da Capital da República - à época, também como se sabe, bastante segmentada nos mais diversos matizes políticos e ideológicos.


II – Os tempos:


À época da fundação da Academia nacional o país prosseguia aceleradamente na tarefa da mudança de seu perfil sócio-econômico: a nação eminentemente agrária do período Imperial continuava a cuidar da instalação de um parque industrial que tivera sua pedra fundamental lançada quase cinqüenta anos antes, pelo Visconde de Mauá. A abolição da escravatura veio desviar os investimentos financeiros do comércio escravocrata para aquele na atividade produtiva, ao mesmo tempo em que criava, ao menos na teoria, um mercado potencial para consumo de bens assim produzidos. O setor terciário crescia com a urbanização e a burocratização da administração pública, ambas condicionantes resultando do aumento da área geográfica de atuação do Estado organizado.

Começava, nas maiores cidades do país, uma febre de urbanização que visava a substituir o traçado da cidade antiga, de feições coloniais, por espaços amplos e planejados à moda da matriz francesa. Esta tendência se verificou então um pouco por toda parte, valendo a pena citar como exemplos duas cidades tão geograficamente distantes: Manaus, sob a administração do engenheiro militar Eduardo Ribeiro (1892-1896), tomava as novas feições da metrópole da “belle epoque” amazônica, que o seria até os anos 20; o Rio de Janeiro, sob a administração do Prefeito Pereira Passos (1902-1906), teve demolido o morro do Castelo e destruídas as antigas ruas coloniais para que fosse rasgada a Avenida Rio Branco, monumento maior da urbanização moderna da Capital da República.

Da mesma forma Vitória, sob a administração de Jerônimo Monteiro (1908-1912) começava a sofrer a intervenção urbana que fora pensada inicialmente na administração de Moniz Freire (1892-1896), num breve momento de especial pujança no comércio do café, e que seria aperfeiçoada, anos depois, na gestão de Florentino Avidos (1924-1928). Ruas e avenidas cortadas, casarios demolidos, a cidade vinha assim adquirindo novas feições, mais próximas de seu aspecto atual.

Como no resto do país, a Vitória do início do século, animada por uma burguesia comercial urbana que ansiava, como em toda parte, por espaços de lazer e por veículos de divulgação cultural que fizessem frente às suas necessidades de expressão e auto-afirmação, conhecia período de verdadeira efervescência: urbanização, saneamento, execução mediante prévio planejamento. Os limites físicos da antiga urbe foram alargados para os lados da Praia Comprida e o sotaque estrangeiro das levas de imigrantes, trabalhadores e empreendedores, deixavam muito longe no tempo a lembrança do acanhado povoado de Duarte de Lemos.

A imprensa existia aqui desde meados do século XIX, datando o jornal O Correio da Victória de 1849. Se pelos tempos de que nos ocupamos a imprensa local não tinha obviamente a pujança daquela da Capital da República, no entanto da mesma forma servia como veículo de expressão de letrados e beletristas, que se tornavam conhecidos do público por sua militância nos periódicos da Capital. Uma classe intelectualizada, integrada por profissionais liberais e funcionários públicos, reunia-se aqui nos cafés e, da mesma forma que na Capital da República, organizava tertúlias em que se versavam não só assuntos literários como também políticos. Esta classe, que em toda parte era à época formada por advogados, médicos, engenheiros, aqui a integravam os filhos de famílias abastadas e que tinham condições de realizar estudos fora da Província.

De todas as formações ditas de humanidades, a jurídica era a que possibilitava na prática maior campo de ação ao se visar geralmente à militância política ou jornalística, ou ambas. E quantitativamente reunia, aqui como na Capital da República, grande parte dos que se poderia chamar “letrados”, no sentido utilizado no início do texto. Esses “letrados”, homens de letras, produziam e veiculavam sua produção, a maior parte na imprensa diária. Se no Rio de Janeiro esta era apenas uma das facetas visíveis de um desde sempre efervescente ambiente cultural, Vitória, graças principalmente a esta atuação da imprensa ia tendo, também, o que sem favor algum se pode considerar um ambiente cultural movimentado.

III – A fundação das Academias:

Neste panorama, a Revista Brasileira - que em sua terceira fase de vida era dirigida pelo crítico José Veríssimo - dava no Rio de Janeiro dos anos 1890 coesão a um grupo de intelectuais que nela publicavam regularmente. Ante o êxito alcançado pelo periódico, Lúcio de Mendonça teve a iniciativa da fundação de uma agremiação nos moldes da Academia Francesa, mas de caráter particular, já que o Estado se escusara, tempos antes, de bancar a empreitada que lhe fora proposta.

Feitas as reuniões preparatórias, instalada a Casa, contam-se dentre os quarenta fundadores nada menos do que vinte bacharéis em Direito, contando-se, ainda, uns poucos que não chegaram a concluir o curso. Mas todos, sem exceção, militavam na imprensa, regularmente ou não, como jornalistas ou colaboradores eventuais, demonstrando seu devotamento às letras pela produção literária.

Ora, a congênere nacional, a mais antiga delas, foi então fundada por um Ministro do Supremo Tribunal Federal (Lúcio de Mendonça, que chegou à Corte em 1895), reunindo em seus quadros nada menos que a metade de bacharéis em Direito, na sua maioria militantes. Ou seja, na sua maioria juristas, no sentido lato, no sentido de praticarem a ciência – ou a arte – do Direito.

Curiosamente, dentre estes fundadores, três tiveram sua vida em algum momento ligada ao Espírito Santo, por coincidência todos os três acadêmicos juristas: Araripe Jr., filho do Conselheiro Tristão Alencar de Araripe, acompanhou o pai que nos meados do século XIX foi Chefe de Polícia em Vitória e chegou posteriormente ao Supremo Tribunal Federal; Herculano Marcos Inglês de Sousa, autor do romance naturalista O Missionário, presidiu a Província do Espírito Santo no ano de 1882, chegando a implantar uma reforma no ensino local; e Graça Aranha, que por pouco tempo ocupou uma cadeira na congênere nacional, tendo logo após rompido com a Academia, foi Juiz Municipal em Cachoeiro de Santa Leopoldina, em cuja lida diária, é de conhecimento geral, recolheu a idéia para seu famoso romance Canaã.

Aquela efervescência que acabou por levar à fundação da Academia Brasileira se verificava, guardadas as devidas proporções, na Vitória do final dos anos 10 e início dos anos 20 do século passado, e sem embargo se estenderia aos anos seguintes com a fundação da Academia Capixaba de Novos, da Arcádia Espirito Santense, da Academia Espírito Santense Feminina de Letras. Àquela altura, já fundado o Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, em 1916, para levantamento e guarda das tradições locais - que o fora, além de por um farmacêutico militar que comandou a Força Pública Estadual (Archimimo Martins de Matos), por um engenheiro, Inspetor de Obras (Antônio Francisco de Ataíde), também por um jovem jurista de grande talento que anos mais tarde presidiria a Corte de Justiça Estadual (Carlos Xavier Paes Barreto) - a Academia Espírito Santense de Letras era instalada em setembro de 1921. Mas ainda não nos moldes da congênere nacional, porque só dando assento, inicialmente, a vinte fundadores. Dentre estes, dez tinham formação jurídica, tornando-se, pela investidura na Casa, juristas acadêmicos: Afonso Cláudio de Freitas Rosa (Cadeira 01); Afonso Correia Lyrio (Cadeira 02); Alarico de Freitas (Cadeira 03); Aristeu Borges de Aguiar (Cadeira 07); Aurino Quintais (Cadeira 09); Cassiano Cardoso Castelo (Cadeira 11); Elpídio Pimentel (Cadeira 12); Antônio Ferreira Coelho (Cadeira 13), José de Barros Wanderley (Cadeira 14); Luiz Adolpho Thiers Veloso (Cadeira 16); Manoel Lopes Pimenta (Cadeira 17) e Jair Tovar (Cadeira 20).

A fundação da Academia Espírito Santense de Letras por um jornalista e escritor, Sezefredo Garcia de Rezende, em companhia de um parlamentar e advogado, Alarico de Freitas, parecia augurar a longa tradição de composição da Casa por juristas e bacharéis em Direito - não fosse a Faculdade de Direito, juntamente com a Faculdade de Farmácia e Odontologia, os mais antigos estabelecimentos de ensino superior do Estado, ambas fundadas em 1930. Dos 122 acadêmicas e acadêmicos já investidos na Casa, algo da ordem de cinqüenta por cento são de formação jurídica. Ora, esta longa tradição legitima a presença entre nós atualmente de 14 juristas acadêmicos, sendo oito egressos das fileiras do Poder Judiciário deste Estado: os Desembargadores Chrystalino de Abreu Castro (Cadeira 14), Rômulo Salles de Sá (Cadeira 35), Antônio José Miguel Feu Rosa (Cadeira 32) e Sérgio Bizzotto Pessoa de Mendonça (Cadeira 28) e os Juízes de Direito João Baptista Herkenhoff (Cadeira 8), Waldir Vitral (Cadeira 7), Magda Regina Lugon (Cadeira 38) e Getúlio Marcos Pereira Neves (Cadeira 33).


IV – Personalidades e literatos:

Nos primórdios da Academia Brasileira Joaquim Nabuco sugeria de Londres a Machado de Assis o ingresso na Casa de figuras de expressão na vida social e política da nação, dando o tom para que a Academia deixasse de ser uma reunião de declamadores (nas palavras de seus detratores) para se tornar num órgão de prestígio e influência. Óbvio que não sem uma grande carga de críticas de todos os lados por este motivo, até mesmo porque, se uma associação de intelectuais tem grande ascendência sobre a opinião pública, uma associação de intelectuais influentes haveria de ter uma ascendência ainda maior.

Mas sem embargo não se pode debitar simplesmente ao prestígio que lhes dava o seu exercício na magistratura o ingresso na Academia Brasileira de Letras dos magistrados Raimundo Correia, o “poeta das pombas” (como, aliás, não gostava de ser chamado); do grande crítico literário Araripe Júnior; do grandíssimo crítico, ensaísta, folclorista, historiador da literatura, Sílvio Romero; do poeta Franklin Dória, o Barão de Loreto; de Rodrigo Octávio, que também chegou ao Supremo Tribunal Federal; do romancista e, por que não dizer, agitador cultural Graça Aranha, que rompeu publicamente com a Academia para se juntar às hostes modernistas. Nem ao prestígio que lhes dava sua função de Presidentes de Província o romancista, memorialista, sociólogo, historiador, Visconde de Taunay; do já citado Franklin Dória, que além de presidir as províncias do Piauí, Maranhão e Pernambuco foi Ministro da Guerra; do romancista e contista Inglês de Sousa, que entre outras presidiu a Província do Espírito Santo em 1882, como já referido.

Da mesma forma não foi somente o prestígio de suas relevantes funções públicas e nas lides jurídicas o que trouxe à Academia Espírito-santense de Letras as pessoas de Afonso Cláudio de Freitas Rosa, Carlos Xavier Paes Barreto, Augusto Emílio Estellita Lins, José Paulino Alves Junior, Eurípides Queiroz do Valle, Ernesto da Silva Guimarães, Kosciuszko Barbosa Leão, Eugênio Lindenberg Sette, Miguel Depes Tallon, Renato José Costa Pacheco, juristas literatos. Nem as figuras de Alarico de Freitas, Aurino Quintais, Luiz Adolpho Thiers Velloso, Cassiano Cardoso Castelo, José de Barros Wanderley, Beresford Martins Moreira, Manoel Xavier Paes Barreto Filho, José Vieira Coelho, que deixaram obras de cunho científico, algumas de inegável valor na sua área de atuação profissional específica.

Uns e outros homens de letras, ocupar-nos-emos por mais um pouco dos primeiros, os que consideramos juristas literatos, os mesmos que chamamos acima letrados, por seu conhecimento literário, que cuidaram de externar através da sua preocupação de investigação, análise, criação, fora de sua área de ocupação ordinária. Deixaram estes juristas literatos obras de caráter histórico, sociológico, antropológico e também literário, propriamente, nos diversos gêneros de literatura: poesia, romance, contos e crônicas, que merecem agora registro.

V – Juristas e literatos acadêmicos:

1) O Desembargador Afonso Cláudio de Freitas Rosa (Cadeira 01) - nasceu em Santa Leopoldina, em 1859, falecendo no Rio de Janeiro, em 1934. O primeiro no Espírito Santo a publicar em manifesto sua profissão de fé republicana, em 1883. Foi o primeiro Presidente republicano do Estado. Com a reorganização do Tribunal de Justiça, em dezembro de 1891, foi nomeado desembargador e Presidente do Tribunal, tendo-se aposentado nessa função em 1920. Transferindo-se para o Rio de Janeiro, dirigiu a Faculdade de Direito do Estado do Rio, onde lecionou na cátedra de Direito Romano até seu falecimento, em 1934. Assim, foi o primeiro Presidente Republicano do ES, o primeiro Presidente após a reformulação do TJ do Espírito Santo e o primeiro ocupante da Cadeira n. 01 da Academia Espírito Santense de Letras.

Foi grande historiador literário, e sua obra História da Literatura Espírito Santense, só editada em 1912, ainda hoje é fonte de referência para o período que estudou.

Foi também o primeiro pesquisador do folclore capixaba, tendo publicado Trovas e Cantares Capixabas; deixou obra sociológica, Compêndio de Sociologia e Crítica, e de caráter histórico: Insurreição do Queimado – Episódio da História da Província do Espírito Santo, de 1883 e História da Propaganda Republicana no Estado do Espírito Santo, de 1922, só publicada integralmente em 2002. Na área jurídica deixou um Direito Romano, em 02 vols, Consultas e Pareceres e outros. Afonso Cláudio foi um dos fundadores do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo e é considerado o maior intelectual capixaba do século XIX.


2) O Desembargador Carlos Xavier Paes Barreto (Cadeira 01) - nasceu no Recife, em 1881, faleceu em 1969. Foi um entusiasta das coisas do Espírito Santo. Começou a vida pública como Promotor de Justiça em Pernambuco, e transferindo-se para o Espírito Santo sua primeira Comarca foi a de Afonso Cláudio. Ao ingressar na magistratura, sua primeira Comarca foi Afonso Cláudio e nesta Casa foi o segundo ocupante da Cadeira n. 01, sucedendo a Afonso Cláudio! Foi a Desembargador em 1926, tendo presidido o Tribunal de Justiça em 1936.

Ao propor a fundação do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo em 1916 tinha em mente o resgate das tradições locais como forma de desmarcar uma identidade capixaba que vinha sendo ameaçada de submersão ante a influência cultural, política e mesmo militar dos estados vizinhos. Seus estudos sobre as questões de limites do Espírito Santo, notadamente com Minas Gerais, influenciaram no deslinde jurídico da questão: Questões de Limites Minas X Espírito Santo, 02 vols., 1915/1917; Questões de Limites do Espírito Santo, 02 vols., de 1918; O território do Espírito Santo, de 1919; Resumo das Questões de Limites, de 1927; Questões de Limites Interestaduais – Contribuição do Espírito Santo à Comissão Especial de Limites, 1931.

Cuidou de aprofundar seu Apontamentos Históricos, Geográficos e Etnográficos do Espírito Santo, apresentado ao VII Congresso Brasileiro de Geografia de 1922 e assim em 1954 publicava, no Rio de Janeiro, A Terra e a Gente do Espírito Santo. Nessa área de interesse das coisas capixabas deixou ainda um Efemérides Espírito Santenses, de 1939. Criminalista, deixou várias obras nas áreas das ciências criminais, destacando-se Indelinquentes, de 1935, e O Crime, o criminoso e a pena, em 02 vols., cuja 2.ª edição é de 1938.

3) O Advogado Augusto Emílio Estellita Lins (Cadeira 13) - nasceu em 1892, no Recife, falecendo em 1982. Bacharelando-se pela Faculdade Livre de Direito do Rio de Janeiro em 1915, em 1916 transferiu-se para o Espírito Santo. Foi Prefeito Municipal de Cachoeiro de Itapemirim e advogado militante, inclusive da Mitra Diocesana de Vitória, tendo sido distinguido pela Santa Sé em 1957 com a comenda da Veneranda Ordem Eqüestre de São Gergório Magno. Com Carlos Xavier Paes Barreto, Arquimimo Martins de Matos e Ciro Vieira da Cunha reorganizou, em 1937, a Academia Espírito-santense de Letras, que presidiu entre 1938/1939 e posteriormente, no ano de 1941.

No campo das letras deixou obra poética de valor apreciável, publicando neste gênero literário o poemeto Lenda da Independência, em 1912; Zorobabel, sonetos, que conheceu duas edições, em 1921 e 1957; e Pranto e Canto de amor filial, também de sonetos, de 1955. Produziu título jurídico de interesse, A paixão coletiva, sobre crime praticado por multidão, publicado em 1923.

Mas nessa área seu feito principal é sem dúvida o alentado estudo da obra de Graça Aranha, Graça Aranha e o Canaã, aliás dedicado à Academia Espírito-santense de Letras e publicado no Rio de Janeiro, em 1968. Ali o Dr. Lins traz referências consideradas por ele indispensáveis ao comentário do Canaã, por meio de trechos escolhidos do próprio Graça Aranha e de outros autores. Sua dedicação ao tema levou-o a publicar o Variações Estéticas do Canaã, que conheceu uma 2.ª edição em 1981, onde pretendeu apresentar, em forma poética, "os motivos e temas versados no romance”, segundo suas póprias palavras.

4) O Procurador José Paulino Alves Junior (Cadeira 32) - nasceu em Porciúncula, no interior do Estado do Rio de Janeiro, em 1895, foi membro do Ministério Público e professor de Português e Literatura da Escola Pedro II, de Vitória.

Em sua obra literária abordou temas históricos caros aos capixabas: a Insurreição de Queimado, em O Caudilho Negro e a Insurreição Pernambucana de 1817, em Idealistas e Rebelados. Ocupou-se, também, de estudos de gramática portuguesa, tendo apresentado a tese de concurso Da preposição e incursionou por temas de reflexão filosófica, no ensaio A Alma existe.

5) O Desembargador Eurípides Queiroz do Valle (Cadeira 27) - nasceu em 1897 em Benevente, hoje Anchieta, faleceu em 1979. Foi um entusiasta das agremiações científico-literárias. Reorganizou o Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo e a Academia Espírito-santense de Letras, instituições que presidiu respectivamente de 1941 a 1963 e de 1951 a 1957, e que cuidou de historiar em A Casa do Espírito Santo – Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo e Academia Espírito Santense de Letras, onde historia a fundação e primeiros tempos da Casa, listando pormenorizadamente as iniciativas da instituição nos idos de 1944, ano da publicação do volume. .

Bacharelou-se pela Faculdade de Direito da Bahia, em 1918, e começou a vida pública como Juiz Municipal, naquele Estado. Retornando ao Espírito Santo em 1921, ingressou no Ministério Público em 1922. Em 1924 foi Chefe de Polícia do Estado, tendo sido no mesmo ano nomeado Juiz de Direito. Promovido a Desembargador em 1950, presidiu o Tribunal de Justiça em 1961. Foi professor de Direito Judiciário Penal da Faculdade de Direito do Espírito Santo.

Sua obra sobre o Espírito Santo compõe-se de “Aspectos do Espírito Santo – História e Literatura”, de 1942 , “O Estado do Espírito Santo e os Espírito Santenses”, de 1971 e “O Espírito Santo – uma síntese”, de 1977, todas de caráter geral. Foi historiador do Poder Judiciário do Espírito Santo, assunto de que se ocupou nas obras “Vida Judiciária Espírito Santense”, de 1951; “Datas e dados da vida judiciária do Espírito Santo”, de 1963 e “Velhas togas Espírito Santenses”, de 1964; da mesma forma ocupou-se do Poder Legislativo, em “Poder Legislativo Espírito Santense”. Deixou diversas obras técnicas na área das ciências criminais, versando o Direito Judiciário Penal e a polícia judiciária e o livro de crônicas “Micrólogos”, de 1969.

6) O Desembargador Ernesto da Silva Guimarães (Cadeira 26) - nasceu em Niterói, Estado do Rio de Janeiro, em 1897, falecendo em 1960. Bacharelou-se pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro em 1923 e vindo para o Espírito Santo ingressou na magistratura vitalícia em 1924. Promovido a Desembargador em 1946, presidiu o Tribunal de Justiça em 1953. Lecionou na cadeira de Direito Civil da Faculdade de Direito do Espírito Santo.

Na área das Letras deixou obra poética também de apreciável valor, nos livros de poemas Meus Versos e meu Violão, Sangue de meu Coração e Um Amor, uma Lembrança e uma Saudade e os sonetos de Violetas de Zabulon. Ocupou-se, ainda, do gênero teatral, publicando, entre 1936 e 1940, três comédias (A moqueca da Belmira; O Voluntário do 3.° BC e A Medalha Milagrosa) e dois dramas (A Chuva de Rosas, em 3 atos e O Sino da Penha).

Sua obra técnico jurídica é especializada em questões menoristas, antecipando, já, tema de grande relevo nos dias de hoje. Versava a questão dos menores, inclusive, perante a ordem jurídica instituída pelo Estado Novo, formas de assistência a eles e sua ressocialização.

7) O Advogado Kosciuszko Barbosa Leão (Cadeira 36) - nasceu em Santa Cruz, no Espírito Santo, em 1889, tendo falecido em 1979. Foi Professor Emérito da Faculdade de Direito do Espírito Santo. Bacharelou-se pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro e foi advogado militante, Chefe de Polícia do Estado e Procurador da Fazenda Nacional.


O patrono da nossa Casa, ocupou-se da poesia com os seguintes títulos publicados: Meditações, 1940; J’TM (je t’aime), que conheceu duas edições, em 1940 e 1977; Travos e Trovas, de 1973; Canoeiros, que também conheceu duas edições, em 1942 e 1977, e Meu Inverno edição póstuma, de 1979. Deixou ainda uma experiência no gênero teatral, a comédia Cinco Noivados, de 1941.

Incursionou com talento pelas cogitações de caráter filosófico, fazendo-o com um cunho mais social no magistral ensaio A Visão da Miséria através da Polícia, de 1933, obra esta que foi apreendida pela Polícia do Estado Novo, e com um cunho mais metafísico, em Alma e Deus, de 1973.


8) O Advogado Eugênio Lindenberg Sette (Cadeira 18) – nasceu em Vitória, em 1918, tendo falecido em 1990. Presidiu a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil e foi Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Foi professor da Cadeira de Direito Comercial da Faculdade de Direito.

Na área das letras foi cronista e poeta, tendo se ocupado, ainda, de tradução de poesia negra norte-americana. Publicou o livro de crônicas Praça Oito, cuja primeira edição é de 1951, tendo sido reeditado recentemente. Participou das coletâneas Sinfonia das ruas de Vitória, publicado em 1943, e Torta Capixaba, em 1956.


9) O Desembargador Homero Mafra (Cadeira n.° 07) – nasceu em Itanhandu, Estado de Minas Gerais, em 1923. Bacharelou-se pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro. Advogado, trabalhou como jornalista nos Diários Associados. Em 1956 ingressou na carreira da magistratura do Espírito Santo, passando a integrar o Tribunal de Justiça em 1974, tendo-se aposentado em 1983.

Educador, lecionou Português e Inglês no Ginásio de São José do Calçado; Literatura, por concurso, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Colatina e Direito Civil na Universidade Federal do Espírito Santo.

Tem publicados trabalhos doutrinários diversos na área do Direito. Cronista elegante, da sua contribuição na imprensa de São José do Calçado compilou-se e publicou-se, postumamente, Três Assuntos em uma Semana, de 1985, e Flauta em Surdina, de 1996.


10) O Juiz de Direito Renato José Costa Pacheco (Cadeira 33) – nasceu em Vitória, em 1928, tendo falecido em 2004. Poeta, romancista, ensaísta, contista, historiador, sociólogo, folclorista, memorialista. O ponto alto de sua produção poética é sem dúvida Cantos de Fernão Ferreiro e outros poemas heterônimos, publicado originalmente em 1985, e que é responsável por colocar sua obra poética sem dúvida acima de sua produção literária em outros campos.

Publicou os romances A Oferta e o Altar, cuja 3.ª edição saiu em São Paulo em 1983; Fuga de Canaã, de 1981; Reino não conquistado, de 1984; Vilão farto, 1991; Eu vi nascer o Brasil, 1997; O Centauro enlouquecido e o pintor amante, 1998; Pedra Menina, 1999. A coletânea de ensaios históricos Estudos Espírito Santenses, em 1994 e um histórico da Capital do Espírito Santo entre 1930 e 1945, Os Dias Antigos, em 1998.

Foi livre pensador no crítico O Macaco Louco (Novum Moriae Encomium), de 2000; fez sociologia e história da cultura, respectivamente em Ensaios de Sociologia da Literatura, de 2003 e A Cultura Capixaba: uma visão pessoal, publicada postumamente pelo IHGES em 2004, e sociologia geral e jurídica em Introdução ao estudo da Sociologia Geral e Jurídica, de 2006. Sua obra esparsa no campo do Direito e também do folclore é muito numerosa. Além disto publicou vários trabalhos de caráter histórico e etnográfico em parceria com Luis Guilherme Santos Neves e Lea Brígida Rocha de Alvarenga Rosa.


11) O Advogado Miguel Depes Tallon (Cadeira 34) – nasceu em Cachoeiro de Itapemirim, em 1948, tendo falecido em 1999. Foi Procurador da Universidade Federal do Espírito Santo e Procurador Municipal da Prefeitura de Vitória. Presidiu o Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo desde 1996 e faleceu em pleno exercício da presidência.

Na área das letras foi poeta, contista, romancista, historiador. Autor de uma das mais recentes História do Espírito Santo, publicada pelo IHGES em 2000. Suas últimas experiências líricas se deram com os hai-kai no livro As rãs de Basho e Outros Poemas, publicado postumamente em 2000.

Também publicado postumamente em 2000 o ensaio História e Ficção em Renato Pacheco, sua dissertação no mestrado em Letras da Universidade Federal do Espírito Santo, que ficou inacabada. Simpatizante das doutrinas políticas de esquerda, fez levantamento histórico nessa área em Spiritu Sanctis Memoralia Coronelensis, publicado pelo IHGES em 2000, e Ciência Política em Manhosa Disputa: Estado versus cidadania no Brasil, monografia final do curso de Especialização em Políticas Públicas da UFES, também publicado postumamente pelo IHGES em 2003.


Praia da Costa, setembro de 2006


Notas:

[1] Esta afirmação pode soar estranha se se pensar nos dias de hoje, em que a formação profissional privilegia apenas e tão somente aspectos técnicos da profissão. Antes das sucessivas reformas do ensino produzidas de meados para final do século XX, a formação específica do futuro profissional era calçada numa formação humanística baseada, sobretudo, no estudo dos clássicos.