11 de abril de 2010

"NUNCA ANTES NA HISTÓRIA DESTE PAÍS"

O estudo da História se faz no mínimo para se evitar a repetição de erros do passado, visando a facilitar o avanço para o futuro. O estudo da desprezada vertente da História cultural, ou das idéias, é bastante útil porque no Brasil se fundam "novas ordens" com certa regularidade, com consequentes trabalhos de remodelagem (leia-se "modernização") das instituições - instituições essas que veem sendo pensadas ao longo de muito tempo. Não se justifica, portanto, nesse trabalho, o repetir-se erros do passado, o repetir-se, sob os mesmos fundamentos, debates já debatidos.
Há, hoje, uma "nova ordem", em que se estabeleceu que o Poder Judiciário deve "descer da sua Torre de Marfim", "parar de olhar para o próprio umbigo", "servir ao povo", "fazer-se necessário" etc etc.
Nessa busca incessante pela modernização das nossas instituições republicanas, volta à baila a questão do acatamento às decisões superiores como exteriorização da "disciplina judiciária do magistrado " (art. 10, parágrafo único da Resolução n.º 106 do CNJ).
No número de 1938 da Revista Espírito Santo Judiciário o advogado Nuno Santos Neves, conselheiro da OAB/ES, discutia no artigo "A Justiça local não está adstricta a seguir a jurisprudencia da Côrte Suprema" a obrigatoriedade de seguir-se no Tribunal local a orientação dos julgados do Supremo Tribunal. Vale a pena transcrever a introdução do artigo (deixando de lado a argumentação jurídica do corpo do trabalho, que dizia respeito às esferas federal e estadual de atuação do Poder Judiciário), como uma simples contribuição para que possamos retomar a discussão desse ponto, para onde parece termos retornado, 70 anos depois:

"Juizes e advogados reportaram-se, perante a justiça local, á jurisprudencia da Côrte Suprema, como se devesse ser obrigatoriamente seguida, obedecida, muito embora pensando, confessadamente, o julgador, em contrario ás razões de decidir daquella Egregia e Veneranda Côrte. O causidico, ante uma citação adversa de um ou dois julgados da nossa Côrte Maior, abandona a doutrina, despreza a exegese da lei, esquece a jurisprudencia dos Tribunaes locaes, e como que attingido fatalmente pelo vaticinio aziago de um oraculo, só descança quando obtem a sua remissão, encontrando um qualquer accordão daquella mesma Egregia Côrte, no sentido do direito que defende.
Parece-nos inteiramente desvirtuosa essa orientação e pratica.
Não somos, nem nunca fomos, irreverente e iconoclasta. Admiramos na Côrte Suprema a maior expressão das letras juridicas do Paiz; o nosso mais douto collegio onde se reunem os proceres da nossa sciencia do direito. Mas ficamos aqui. Não lhe atribuimos virtudes oraculares. Não citamos a sua jurisprudencia como os antigos escolasticos a Aristoteles: magister dixit, e tanto basta.
Não ha duvida que em direito, como em relação a qualquer outra disciplina, é sempre commodo e mesmo util estar-se magni nominus umbra, mas para a justiça, o que deve pesar é a autoridade do argumento e não tão somente o argumento da autoridade."