2 de novembro de 2023

"... Da praia de Boa Viagem"...

                                                                                    

 Daqui a uns dias teremos Alceu Valença novamente 
em Vitória. Nada demais, é claro, a capital capixaba já entrou, há muito, no roteiro nacional de shows e outros entretenimentos. Mas é que da notícia eu soube por um confrade com quem conversava ao celular, coincidentemente no dia em que recebia pelo correio a mais atual biografia de Alceu. O inventor da banda de pífanos elétrica, definiu o expert Luiz Gonzaga (o exuense, ele mesmo, o maioral dentre os que se ocupam da música por lá). Apreciar a sonoridade do bardo pernambucano é coisa comuníssima Brasil afora, e a muitos e muitos carnavais no Recife dei adeus só depois de encerrado o show de Alceu, religiosamente o derradeiro show antes do congraçamento geral no Marco Zero daquela fantástica urbe (alô, meu amigo Vinícius Muline!).   
 

Bom, mas como tudo na vida, há quem goste e quem não goste. Há até quem levante o colonial passado de engenho-patriarcal da família do cantor, que assim teria sido opressora etcétera e tal, que essas coisas estão na moda e dão ao “levantador” uma aura bacana, muito apetecida nos saraus de hoje em dia por aí afora. Simpatia, amigos, como se sabe, é quase amor, e amor é o que importa. Mas, e no entanto, as duas ocorrências juntas, - a vinda de Alceu a Vitória, a chegada da sua biografia -, me fizeram lembrar as tardes de verão que há anos passei, meio largado, nas areias de Boa Viagem, a praia mágica da capital dos pernambucanos. A praia da moça bonita de que Alceu se lembra na canção famosa, e de que por sorte eu, de minha parte, me lembro também. Não da mesma moça bonita, é claro; uma outra, que moça bonita é o que não falta em Boa Viagem. 

 

Pernambuco é meu estado-de-espírito desde há muito tempo. Mais precisamente desde que um amigo pernambucano, o Jerônimo, vulgo None (amizade dos tempos de faculdade no Rio de Janeiro herdada do meu tio Almir), me desafiou: “por que você não vai conhecer o Recife? Se for uma vez, garanto que vai querer voltar sempre”. Era no início do século em curso. Meio que duvidando eu ri mas fui, aproveitando uma visita que o citado faria a famíliares num mês de janeiro. E foi dito e feito. Chegados lá a sua prima, cujo marido trabalhava em Natal, nos “adotou”, dando-nos pouso e nos levando a nós e mais a sobrinha a pontos turísticos escolhidos a dedo, tudo contra apenas e tão-somente o financiamento da gasolina. Foi quando, a exemplo de Alceu, tive minha experiência com frequentadora da praia de Boa Viagem. Na verdade, uma visitante, como eu. E daí as tardes de janeiro passadas à beira do mar de águas verdes de Boa Viagem, em companhia da morena. E mais, ali na sobra, do morenense, que o meu amigo None era natural da cidade-satélite do Recife (inesquecível cidade de Moreno onde, premido pelas circunstâncias, tive de me virar uma noite para dançar um forró). Tardes passadas à beira-mar, vendo as pessoas a veranear e apreciando a paisagem até o sol se pôr. Dias e dias à base de cerveja e caldinho de feijão, que no Recife, servido num funcional copinho de plástico, vem com milho, torresmo, ervilha e ovo de codorna, e nos mantinha alimentados até o chopp da noite, no bar que ficava embaixo do nosso prédio e que frequento até hoje quando volto à cidade. Onde, nesses mesmos dias, o None receberia uma notícia profissional ruim, que depois de algum tempo determinaria o seu retorno do Rio de Janeiro à Moreno natal em que viria a falecer. 

 

Se os fatos aconteceram como contei já não vem ao caso. Tantos anos depois, e aproveitando que escrevo num 2 de novembro, registro aqui que estou devendo uma visita à “última morada” do amigo que me apresentou ao Recife e a Boa Viagem, e que naquela certeza que todo pernambucano tem em se tratando da sua terra, vaticinou o meu amor por ela. Terra que continuo a frequentar, até mesmo porque outros amigos pernambucanos me honraram com o título de membro do Arqueológico, o mais antigo Instituto Histórico estadual. Mas que  hoje frequento em outra companhia, vivendo outras histórias.

 

Voltando, então, à agenda cultural, Alceu Valença que nos venha abrir a temporada de verão por aqui, a me lembrar do mar tépido da sua luminosa terra, tão diferente das gélidas e impactantes águas do mar da Praia da Costa - que, aliás, sendo a minha praia cotidiana, rende (e renderá) muito assunto...